Vivia inerte, como quem vive sem
razões para ser feliz. Mas deixei a porta aberta, fingindo esquecer que
deveria, por vários motivos, deixá-la fechada, trancada e sem a chave por
perto. Maldito deslize; acabei por permitir sua entrada no meu campo de
domínio. Ora, mas que mal haveria em dividir minha inércia com alguém que pouco
faz se está perto ou não? Traiçoeiro esse pensamento...
Deixei-te entrar. Fizestes emergir os
mais adormecidos sentidos, acordando o meu melhor. Mal sabia que também poderia
eu dar de cara com o teu pior. Talvez por ignorância ou, quem sabe até
insensatez, prossegui na dança, embriagada por tuas palavras, teu aroma e teu
cinismo, que me surpreendeu ao aparecer.
Em meias palavras, dizem que a vida se
preenche com tropeços e acertos. Tu foste meu acerto. Sem ti continuaria a
acreditar que há bondade exacerbada em uma única só pessoa; que há sinceridade
em olhares recém-encontrados; que há, de fato, controle da razão quando esta se
prostra diante da emoção. Sem ti não saberia que sou capaz de perder a
admiração por quem me traz decepções.
E que a admiração se esvai, sem
precisar levar o carinho. Ou seria pena?